"Não existe almoço grátis", diria o economista Milton Friedman. A
conta, todavia, nem sempre vem no término da refeição, especialmente num
mundo em que conteúdo intelectual transita livre e gratuitamente pelas
teias da grande rede.
Há alguns anos, o editor-chefe da Wired Magazine, Chris Anderson,
escreveu sobre as mudanças no modelo de negócios envolvendo conteúdo
digital. Suas reflexões, publicadas no livro "Free", chegaram à
conclusão de que a cultura digital traz inexoravelmente o conceito de
acesso gratuito aos produtos, quaisquer que sejam eles. E mais: que a
novidade, cedo ou tarde, estaria alastrada e tomaria conta da economia
convencional, a das ruas.
Exageros à parte, é irrefutável o fato de que a massificação da
internet promoveu inúmeras mudanças no modelo econômico tradicional: as
gravadoras, talvez, foram as primeiras a sentir os ventos de uma nova
realidade. Com o trânsito livre das canções pelos nós da rede, os
álbuns, na prática, tornaram-se espécies de brindes para promover os
shows dos artistas, causando a desgraça financeira de muitas gravadoras
(como a Abril e a Sony Music, que preferiram encerrar operações no
país).
Num segundo momento, a indústria editorial passou pela mesma
convulsão. Com a facilidade do usuário em acessar e intercambiar
notícias e textos gratuitamente, muitos jornais e outros veículos
entraram em crise, e nomes de calibre, como o The New York Times e a
revista Business Week tiveram de migrar para o formato digital.
Enciclopédias clássicas, como a Britânica, verteram para o mundo seus
conteúdos, livres de qualquer cobrança, a reboque da Wikipedia.
Algo semelhante, agora, começa a chacoalhar a indústria do software:
já temos ótimas suítes de escritório gratuitas, sistemas operacionais
com licenças free, centrais de e-mail, agenda e diversos utilitários
(como os antivírus) de graça - que antigamente seriam vendidos e a um
valor bem salgado.
A pergunta correta deste novo modelo é: ele é sustentável? É possível
garantir sua longevidade ou tudo não passará de um grande bolha
fomentada pela especulação financeira, como a que estourou na bolsa
eletrônica Nasdaq em 1998? É compatível com a nossa vida capitalista?
Como Chris Anderson pontua em sua obra, há sim, formas de geração de
receita dentro deste novo modelo de negócios. Talvez não no nível
altruísta que ele imaginou, mas algo que já é palpável atualmente.
1- Mudança do foco de atenção para o eixo de serviços
Antigamente, o conteúdo vendia-se por si mesmo. Mas quando tratamos
de obras "digitalizáveis", o que se percebe é a mudança da fonte de
receita para os serviços agregados. Assim, por exemplo, em vez de vender
um site, vende-se a sua manutenção; em vez de vender o sistema
operacional, vende-se o suporte técnico; em vez de vender-se o software
comercial, vende-se a consultoria...
2- Somando valor agregado a partir de uma opção gratuita
Esse é um dos primeiros estágios da sociedade "freemium" que Chris
Anderson previu. Na verdade, trata-se de uma estratégia de negócio que
envolve um meio termo entre a primeira opção e o brinde. O fabricante
(geralmente de software) oferece seu produto para consumo gratuito, mas
agrega opções comerciais para os consumidores que querem se aprofundar
em seu uso, como packs de modelos prontos e versões mais rebuscadas do
próprio programa.
Na música, tal modelo é correntemente utilizado para atrair os
colecionadores. Se por um lado músicas podem ser baixadas facilmente
pela internet, um box temático com os maiores sucessos de sua banda
favorita, com um livro encadernado e outros apetrechos, acaba por atrair
o consumidor pelo diferencial do valor agregado.
3- Amealhar o maior número de pessoas (audiência) para vender publicidade
A publicidade é uma velha fonte de receita dos meios de comunicação
tradicionais, como a TV, o rádio e as revistas. Contudo, a internet e os
conteúdos online estão ganhando cada vez mais verbas das assessorias de
imprensa. E não é à toa: são os serviços que mais crescem em número de
acessos, tomando espaços importantes antigamente ocupados pelas outras
mídias.
Divulgar seu conteúdo ou site na internet gratuitamente para atrair
uma grande visitação é uma das receitas básicas para fazer dinheiro com
conteúdo grátis. Estão aí os blogs que vivem de Ad Sense do Google que
não nos deixam mentir. Idem o Facebook. E já existem até autores que
preferem publicar seus livros gratuitamente para ganhar dinheiro com a
publicidade que as suas visitas trazem.
4- Unir mundos e escolher os clientes a pagar a fatura
É o que muitos aplicativos na nuvem fazem: permitem o uso e a
popularização de um serviço para cobrar, por exemplo, apenas daqueles
que podem ver na adoção dessas ferramentas uma forma de alavancar seus
próprios negócios. Neste caso, a venda de ferramentas adicionais para
tirar melhor proveito de um conteúdo gratuito também pode ser um modelo
viável, o que une um pouco da realidade descrita no terceiro item com a
do segundo. O Google é perito neste tipo de estratégia.
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